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A Cracolândia sob a lente dos pesquisadores



Cracolândia (por derivação de crack, crack+lândia = terra do crack) é uma denominação popular para uma área no centro da cidade de São Paulo, nas imediações das Avenidas Duque de Caxias, Ipiranga, Rio Branco, Cásper Líbero, Rua Mauá, Estação Júlio Prestes, Alameda Dino Bueno e da Praça Princesa Isabel.


O nome crack, quando pronunciado em inglês, reproduz o barulho da substância ao ser consumida. A droga teve origem nos Estados Unidos nos anos 1980 e é uma forma impura de cocaína apresentada em cristais para ser fumada em uma espécie de cachimbo. Sua ação é rápida porque a droga é inalada, o que aumenta seu poder de dependência. O crack é vendido a baixo preço e é um dos negócios mais rentáveis do narcotráfico.


A Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD) da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) realizou estudo na Cracolândia e traçou o primeiro perfil dos frequentadores da região por meio de séries históricas feitas em 2016, 2017 e em 2019, antes da operação realizada pelo governo municipal na região. Dados foram divulgados nas mídias escritas e digitais e pelo pesquisador ad UNIAD, Rodrigues (o link encontra-se no final do texto).


O Brasil está entre os países com maior prevalência de consumo de cocaína e crack no mundo. A pesquisa trata de um microcosmo desse problema, a Cracolândia. Por que microcosmo? Não podemos esquecer que existem Cracolândias espalhadas em outros lugares da cidade, menores, mas com todos os problemas que envolvem os usuários de drogas lícitas e ilícitas.


Um pequeno recorte da pesquisa


Alguns dos dados divulgados:

População heterogênea


A pesquisa revelou que a população que frequenta a Cracolândia é desigual:

- 71,8% dos frequentadores daquele espaço são homens e 11,3% transgênero;

- ao longo dos anos pesquisados houve diminuição no número de mulheres de 34,5% para 16,9%;

- dos entrevistados, 55% responderam que estão motivados a cessar o consumo e realizar tratamento – um aumento de 44% em relação ao último levantamento;

- 53% fizeram avaliação de saúde no último ano, sendo que 20% apontaram o Centro de Referência em Tabaco e Outras Drogas (CRATOD), como mais utilizado.


Saúde mental


Os dados da pesquisa apontam um grande impacto nas pessoas em razão do uso das substâncias, da situação de vulnerabilidade e na saúde mental daqueles que moram na região.


Mulheres:

- das entrevistadas, 50% tentaram suicídio e 65,9% já pensaram na possibilidade de se matar;

- as porcentagens com relação à automutilação, também são altas: 66,7% assim como os quadros psicóticos, 70,4%.


Homens:

- 58,3% apresentaram quadros psicóticos e 48,4% praticaram automutilação;

- quase metade, 46,4%, já pensou em se matar, enquanto mais de um terço, 38,2%, de fato tentou o suicídio.


Grau de instrução

- 70% não terminaram o ensino médio;

- 36,1% não concluíram o ensino fundamental;

- 5,2% nunca estudaram.


Contato com a família

- mais da metade, 53,2%, não mantém mais contato com a família;

- 63% não retornaram para casa depois de ir à Cracolândia.


Porta de saída

Entre os fatores que levariam os usuários a abandonarem a Cracolândia, o trabalho foi o principal, com 44%, seguido por amparo familiar em 32,8% e residência 20%.


Os dados da pesquisa apontam a diversidade e vulnerabilidade daqueles que moram na região. Eles se afastaram da família, não recebem cuidados médicos e psicológicos adequados e não contam com o necessário amparo social.

A Cracolândia, talvez pelo número de pessoas que residem ou passam por lá, talvez pela especulação imobiliária, de olho no local, não é um exemplo único de concentração de usuários de substâncias lícitas e ilícitas, o que se conclui que as políticas públicas a serem adotadas com o objetivo de diminuir o problema ultrapassam a adoção de medidas pontuais.


Quando se observa a escolaridade dos frequentadores da Cracolândia, pode-se questionar as políticas para a educação. É preciso investimento para tornar as escolas públicas atraentes, acolhedoras, envolvidas em projetos com a família e comunidade onde está localizada. É preciso investimento na formação inicial e continuada dos profissionais da educação. É preciso questionar a população em geral, sobre a necessidade de oferta de trabalho, cultura e lazer para todos. Afinal, que mundo queremos para todos?


As ações destinadas à população que mora ou frequenta a Cracolândia, exigem o trabalho parceiro entre as diferentes secretarias de Estado, com ações junto às/com as famílias e com as organizações sociais selecionadas mediante critérios que comprovem sua atuação exitosa na área. Aos usuários precisam ser oferecidos locais onde equipes multidisciplinares trabalhem em conjunto: psiquiatria, psicologia, assistência social, terapia ocupacional.


Para saber mais sobre o assunto:

LARANJEIRA, R., Supervisão, MADRUGA, C. S., Pinsky, I.; CAETANO, R., & MITSUHIRO, S. S. (2014). II LENAD - Levantamento Nacional de Álcool e Drogas. Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas (INPAD), UNIFESP, São Paulo. Acesso em 9 de fevereiro de 2010, disponível em:

https://inpad.org.br/wp-content/uploads/2014/03/Lenad-II-Relat%C3%B3rio.pdf

Pesquisas Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz. Acesso em 11 de fevereiro de 2010.

https://programadrogas.fiocruz.br/publicacoes/livros/51

https://www.documentcloud.org/documents/6111419.html#document/p1

RODRIGUES, L.A.S.; SILVA, C.N.G.; RABELO, M.S. e SILVA, P.R. Estudo descritivo da Cracolândia de São Paulo: dimensões, perfil sociodemográfico e indicadores de vulnerabilidade social. Revista UNIAD, Instituto Nacional de Pesquisa em Álcool e Outras Drogas (Inpad). Acesso em: 4 de fevereiro de 2020.

http://www.revistauniad.com/?page_id=857

Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD). Acesso em 10 de fevereiro de 2020.

https://www.uniad.org.br/educacao/



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